domingo, 25 de julho de 2010

DÓRAK MÁLLER




"Dentro da caverna escura ele ouviu o som das gotas chocando-se contra o chão de cascalho. E um tremor terrivelmente próximo reverberou entre as partículas de pedra maciça, seguindo seu curso para dentro de onde o medo se escondia em Dórak Maller. Um ruído grave, de uma inteligência estranha que o perseguia em seu interior, como um cão em busca da ave abatida.

Naquele momento, o caçador de dragões percebeu que havia sido capturado pelo rumor da criatura. Sentiu que seu corpo e a caverna haviam se fundido em um bloco compacto, na prisão dos piores pesadelos.

Era o que se sabia entre os caçadores experientes. Que um homem não poderia enfrentar um ser das chamas quando este já o tivesse invadido, que não deveria sequer pensar fazê-lo empunhando armas comuns...

... Pois, para uma criatura do fogo, esta era a passagem para a alma de seu algoz.

Dórak não tinha saída quanto a isto. Estava sob o domínio de sua própria caça; era uma montanha de rocha e seus buracos, um coração vazio dominado pelo dragão que o habitava.

E o tremor que lhe havia invadido a alma, puxava-o cada vez mais para o interior da caverna; os pés conduziam-se estranhamente, as mãos quase inertes e aquele som através das rochas, atormentando seu espírito. A umidade havia cessado e em seu lugar um calor penetrava fundo, travando lentamente os pulmões. A esta temperatura os sentidos estavam dormentes e imagens erigiam de sua memória como numa grande tela, cercando sua visão com cenas das quais ele queria fugir, cenas de seu passado vindo à tona, de segredos cuidadosamente enterrados e disfarçados por anos e anos até que tivessem caído em total esquecimento…

Dórak estava preso a essas projeções. E não podia evitá-las pois elas também revelavam os caminhos por dentro daquele labirinto de pedras no qual ele se embrenhava. o caçador via através dos olhos do dragão e sentia o ódio dele dentro de si mesmo. Tal sentimento obrigando-o a uma aproximação que lhe causava um desgosto e uma amargura por ele nunca antes perscrutados.

E agora eles estavam mais próximos. Todas as veias do corpo latejando sob a pele quente, o suor evadido pela pressão… cada vez mais próximos… ele não suportaria mais, precisava respirar, não conseguia trazer os ar para dentro… a garganta seca, arranhando, os tendões doíam, as mãos enrigecidas… mais perto, mais perto do que nunca…o cascalho ao chão se espalhava a cada passo, deixando um rastro para trás em direção ao tunel seguro em que estivera e do qual não queria sair.

E de repente o frio. Um choque percorreu-lhe os ossos, deixou-o cego por um instante, uma dor inconcebível. Até que o escuro foi substituido pela luz e, então, pode finalmente respirar. E o ar enxeu-lhe os pulmões e o sangue fluiu dissipando-se pelo organismo. Dórak sentia a vida, sentia o bem estar em contraste absoluto ao que passara.

Abriu os olhos diante de um salão enorme, no que seguiu-se um lampejo de consciência: ele havia renascido.

E ficou ali, naquela vastidão de pilares de cristais brancos e azuis, em silêncio, admirando o suntuoso palácio onde deveria haver uma caverna escura.

Estava, pronto finalmente, para enfrentar o verdadeiro dragão."

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Escrito e ilustrado por Estêvão Teuber, como parte das histórias criadas por ele e por Morgana Raitz ( livro em andamento).

Grafite e papel.

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